quinta-feira, maio 24, 2007

Transparência II

'When I use a word,' Humpty Dumpty said in rather a scornful tone, 'it means just what I choose it to mean - neither more nor less.'
Lewis Carrol

É uma bela frase para quem se pergunta porque é que eu digo o que digo... cada palavra, tal como cada acto, é cautelosamente medida, numa franqueza cuidadosa, onde não se diz a mais, mas também não se diz a menos.

Todos temos um pouco de Humpty Dumpty em nós.

Transparência

"If you want to see the true measure of a man, watch how he treats his inferiors, not his equals.", escreveu um dia a J.K.Rowling.

É uma frase bastante acertada, e cada vez mais testemunho exemplos disso. Quem me conhece sabe que não suporto hipocrisa, mentira, falta de espinha e cabeças baixas.
Para mim só existe uma medida no mundo, a medida do que é certo, não do que é fácil ou cómodo. Não existem pessoas que temos de tratar com respeito porque estão acima de nós ou exercem algum tipo de poder, mas sim pessoas que devem ser tratadas com respeito porque o merecem.
Cada vez mais me desiludo com as pessoas. Cada vez mais as pessoas são fúteis e sobem na vida num verdadeiro desafio à leis da Física: na horizontal. Conceitos como honra, dignidade, coragem, lealdade, coerência são apenas palavras. Para mim serão sempre valores.
Cada vez mais me desiludo com aqueles que tratam como iguais os que julgam ser seus iguais, tratam com reverência os que julgam ser seus superiores e com desprezo os que julgam ser inferiores. Desiludi-me com mais uma pessoa, que achava recta e honrada. Uma pessoa que eu achei que veria além das aparências. Mas o homem é corroído e cai, desilude e fere, e não há nada a fazer.
Uma cara de anjo a esconder um coração podre continua a fazer muito mais sucesso. Mas eu prefiro a minha franqueza caústica, a minha rudeza, voz rouca a responder de sobracelha franzida, mas igual a mim mesma, sem artifícios nem segundas intenções.
Posso não ter um coração de ouro nem cara de anjo, mas o coração é de aço, que não torce nem risca. E venha quem vier, eu sou assim e também prefiro pessoas assim. Porque pelo menos sei com o que conto.
Transparência.

Dedicado a algumas pessoas com quem o meu caminho já se cruzou... felizmente, hoje em dia, só as vejo na estação enquanto o meu comboio passa.

He wishes for the Cloths of Heaven



Had I the heavens' embroidered cloths,
Enwrought with golden and silver light,
The blue and the dim and the dark cloths
Of night and light and the half-light,
I would spread the cloths under your feet:
But I, being poor, have only my dreams;
I have spread my dreams under your feet;
Tread softly because you tread upon my dreams.

Um dos mais belos poemas de sempre... pelo poeta irlandês William Butler Yates.

domingo, maio 20, 2007

Fado do Encontro



Vou andando, cantando
Tenho o sol à minha frente
Tão quente, brilhante
Sinto o fogo à flor da pele
Tão quente, beijando
Como se fosses tu

Ao longe, distante
Fica o mar no horizonte
É nele, por certo
Onde a tua alma se esconde
Carente, esperando
Esse mar és tu

Pode a noite ter outra cor
Pode o vento ser mais frio
Pode a lua subir no céu
Eu já vou descendo o rio...

Na foz, revolta
Fecho os olhos, penso em ti
Tão perto, que desperto
Há uma alma à minha frente
Tão quente, beijando
Por certo que és tu

Pode a lua subir no céu
E as nuvens a noite toldar
Pode o escuro ser como breu
Acabei por te encontrar

Vou andando, cantando
Tive o sol à minha frente
Tão quente, brilhando
Que a saudade me deixou
Para sempre,
Por certo
O meu Amor és tu.

Tim&Mariza
Foto de Dionísio Leitão

Um verdadeiro hino para um amor eterno.

sexta-feira, maio 18, 2007

Para o Zé Gato

"E Ulisses, cansado de prodígios, chorou ao ver as praias de Ítaca."

É a segunda vez, deste que tenho este blog, que começo um texto assim. No entanto, os textos são diferentes, para pessoas e por razões também diferentes.
Faz hoje um ano que morreu o Zé Augusto. O vazio que senti no momento em que soube da sua morte continua, e há-de sempre continuar, não por me afogar em tristezas. Simplesmente porque ele é uma pessoa insubstituível.
É a primeira pessoa em que penso quando acordo, e a última que me lembro quando me deito. Esteve presente nos grandes momentos da minha vida, bons e maus. Foi não só um amigo, mas um mentor e um exemplo. Era um ser humano maravilhoso, e a sua perda foi irreparável.
Ainda dou por mim, quando estou sozinha, a falar com ele como se ele estivesse ao meu lado. Porque eu sei que está. Ele era, acima de tudo, um protector, e eu tenho a certeza que ele olha e continuará sempre a olhar por aqueles que amava e o amavam também.
Durante este ano, houve muitas mudanças. A sua memória foi profanada, mas graças a muita paciência e empenho da minha parte e do bom e querido Francis, tudo voltou ao seu lugar. Os seus filhos vieram para Portugal e alterámos os nomes (ufff...). No entanto, ao invés de traduzirmos os nomes, escolhemos novos nomes, os nomes portugueses que o Augusto mais gostava: Helena e Salvador. E é para eles que escrevo, para que fique marcado, para os filhos dele que agora são pequenos mas um dia serão gente feita, saibam e tenham orgulho do pai. Que lhe sigam as pisadas e que herdem o seu carácter e bondade
Dá uma dor pequenina, um aperto no peito. Chama-se saudade, e eu tenho muitas saudades desse homem que foi um herói, mas herói como Ulisses. Lutava por uma causa, estava meses sem aparecer, mas quase chorava de alívio quando chegava a sua terra. Porque tal como Ulisses, não buscava fama nem fortuna. Buscava apenas a paz e a liberdade.

Para o meu querido Zé Augusto, que no meu coração há-de viver para sempre.

segunda-feira, maio 14, 2007

De mãos dadas


Há pessoas que passam e nem as vemos.

Há outras com quem convivemos e temos uma boa relação, mas um dia deixamos de as ver, esse dia transforma-se em semanas, meses, anos, até que se torna apenas numa memória esporádica de quem guardamos bons momentos, mas já um pouco turvos.

Outras, que logo desde o primeiro minuto não gostamos, e apostamos todo o nosso ser em não gostar.

E depois aquelas, que aparecem de mansinho, que vamos conhecendo, com quem partilhamos choros e risos, mágoas e alegrias, chocolates e desilusões. Pessoas com quem é fácil passar horas num café a conversar sem o tempo dar sinal. Pessoas que estamos do lado delas para acompanhar, atrás para dar coragem e à frente para defender. Pessoas a quem não limpamos as lágrimas, simplesmente as deixamos escorrer até ao queixo enquanto lhes oferecemos a segurança de um abraço. Pessoas por quem choramos quando ficamos felizes por elas.

E de repente apercebemo-nos que já não são apenas pessoas. São os amigos, aqueles de verdade, aqueles que só aparecem quando o universo se junta numa conjunção cósmica e mágica. São pessoas com as quais atravessamos a vida de mão dada, porque nunca nenhum amor será tão forte, puro e verdadeiro como o de dois amigos.

Não tenho muitos. Mas os que tenho apoio sem recusar, consolo sem acusar e defendo sem pensar. Mas acima de tudo, os meus amigos conquistam feitos e eu orgulho-me tanto ou mais como se fossem meus. Porque os amigos são assim. Para o que der e vier.

Para a minha mana pequenina, meu orgulho, meu apoio, meu suporte, a razão de eu ser mais forte... um beijo.